Depois de anos sendo um pop culture junkie, finalmente resolvi canalizar minhas energias em algo útil (assim, dependendo da sua perspectiva). Esse blog tem, portanto, o objetivo de documentar quem está causando na cultura pop mas não comentando do óbvio e sim antecipando tendências e o que está por vir. E-mail me @ tacausando@gmail.com. Mais sobre a nossa proposta.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Diva-a-thon

Faz alguns anos, American Idol reinava solo na TV estado-unidense. A tentativa da ABC de lançar um concorrente, The One (baseado em Operacion Triunfo, formato espanhol que deu origem ao Fama da Globo), foi um fracasso tão custoso que desencorajou qualquer tipo de concorrência com o titã da FOX, que é o programa mais lucrativo da TV local.

Tudo isso mudou em um piscar de olhos no fim de 2010. Primeiro, Simon Cowell, o juiz estrela de Idol, anunciou que iria sair do programa para lançar uma versão local de The X Factor, concurso de talento com formato similar a Idol que ele produz e estrela com gigantesco sucesso no Reino Unido. Daí, antes que Cowell tivesse a oportunidade de lançar seu programa, a NBC comprou os direitos de um outro concurso de canto que tinha se provado um fenômeno na Holanda e, pasmén, The Voice se provou um grande sucesso.

De repente, a situação de Idol estava caótica: de reinar solo como o programa número 1 nos EUA para, de repente, ter dois programas similares que tinham tudo para serem fortes rivais. E, pior, com a saída de Cowell, o programa tinha perdido sua grande estrela.

Porém, rapidamente Idol restabeleceu seu poder quando apontou Jennifer Lopez e Steven Tyler como novos juízes em sua décima temporada. Os dois nomes de peso foram bem recebidos e Idol continuou liderando as audiências da TV estado-unidense. Mais do que isso, o programa provou que um concurso de talento pode go a long way em ressuscitar carreiras.

Enquanto, no Reino Unido, The X Factor transformou todos os seus juízes (particularmente Cheryl Cole) em gigantescos A-listers, a situação era diferente nos EUA. Idol tinha transformado Randy Jackson e, particularmente, Simon Cowell em household names mas ambos eram anônimos antes do programa e, enquanto Paula Abdul lucrou bastante durante seu stint no programa, o sucesso de Idol não ajudou muito a dar novos ares a sua carreira e, tirando o seu papel como jurada de AI, todas as outras tentativas de Paula de voltar a mídia (reality shows; singles novos) fracassaram.

Então, J.Lo era basicamente a primeira artista que tinha um enorme apelo e household name a assinar para ser jurada num concurso de talento no país. E, apesar de ser uma celebridade de grande escalão, a carreira da moça estava bem pouco rentavel até ela finalmente assinar um contrato de modestos 12 milhões de dólares para julgar Idol.

Lopez: de volta a relevância e as capas de revistas
O resultado? A exposição fez Lopez voltar a capas de revistas; emplacar seu primeiro smash hit global em quase uma década (o catchy On the Floor); sair em sua primeira turnê de arenas mundial; filmar dois filmes e assinar dezenas de contratos milionários com diferentes marcas (linha de roupa na Kohl's, extensão do contrato com a L'Oreal, novos perfumes, etc).

Depois do sucesso de Lopez, ter desconhecidos no painel de jurados não era mais uma opção e ter nomes fortes virou ainda mais importante depois que The Voice, o concorrente da NBC, se transformou num grande sucesso e também ajudou a rerguer a carreira de seus jurados.

Com um salário de 10 milhões de dólares, a grande estrela do programa era Christina Aguileira. Com centenas de milhões de CDs vendidos, a moça ainda estava se recuperando do enorme fracasso que tinha sido seu último CD mas, evidentemente, ela ainda tinha name recognition o suficiente para atrair um salário milionário. E o sucesso do programa a ajudou a superar o enorme fracasso do seu CD e ser abraçada novamente como uma personalidade reconhecivel e com certo valor de mercado (apesar de que o nicho de Christina Aguileira ainda é meio incerto).

Porém, apesar de comandar o salário mais alto, não foi Christina a que melhor se saiu com o sucesso de The Voice. Os mais beneficiados foram Adam Levine e Blake Shelton. Levine se transformou num pinup desejado, atraindo diversos contratos e fazendo com que sua esquecida banda, Maroon 5, alcançasse um novo pico e emplacasse um dos maiores hits do ano passado, Moves Like Jagger (que continha vocais de Christina). Já Blake virou um dos nomes mais reconhecíveis do country emplacando diversos número 1 nas rádios do gênero e alcançando disco de platina com seu último lançamento.

Enquanto Idol e The Voice monopolizavam as manchetes e capas de revistas com suas grandes estrelas, Simon Cowell teve mais dificuldade para achar A-listers para ocupar os postos de jurados no X Factor. Depois de inúmeras especulações, que foram de Will Smith a Katy Perry, o painel se mostrou extremamente underwhelming quando finalmente revelado: Cowell, uma estrela in its own right, e L.A. Reid, um dos executivos da indústria musical mais respeitados dos EUA, deveriam ser acompanhados por moças A-listers para completar um dream team mas, no final das contas, eles acabaram com Paula Abdul (que Cowell resolveu dar uma segunda chance já que a química deles tinha sido bastante elogiada em Idol) e Nicole Scherzinger, a ex-Pussycat Doll. Não empolgou e, no final da temporada, as duas moças foram demitidas.

E daí começaram novamente as especulações. E Cowell precisava go hard or go home. E hard he went: Britney Spears, um dos maiores ícones da música pop, assinou para julgar a nova temporada por 15 milhões de dólares, ultrapassando os salários de Lopez e Aguileira. Contratar Britney foi um golpe esperto por dois motivos: primeiro que é um tapa na cara de The Voice, uma vez que ela sempre foi a concorrente mais bem sucedida de Aguileira e, segundo, ela é uma das celebridades que mais atraem interesse e audiência nos EUA, com suas aparições no MTV Video Music Awards; em Glee e em How I Met Your Mother sendo responsável por recordes de audiência em todos os três.

É claro que tem a questão de que Britney Spears está praticamente morta. Ela é um zumbi: seus olhos sem expressão, sua linguagem corporal retraída, sua voz robótica. Desde 2008, ninguém pode entrevista-la sem seguir um estrito roteiro fixado por seus empresários e ela própria parece estar sempre perdida e com medo. Não parece uma receita de sucesso como jurada mas, pelo menos de início, é sim uma receita de sucesso de audiência. E não tem como negar que, em questão de potenciais jurados, é difícil conseguir alguém que atraía mais interesse e tenha mais name recognition que Britney.

Nos trailers e entrevistas com a imprensa, Cowell tenta pintar Spears como uma jurada forte e opinativa. "Ela vai surpreender a todos!". "Ela é mais má do que nós esperavamos!". Mas é só ver a cantora posando numa coletiva de imprensa para promover a nova temporada que essa imagem se quebra: lá está Britney, com os olhos assustados, o sorriso forçado, suas cutículas mastigadas e sangrentas.

As unhas de Britney demonstram nervosismo durante coletiva de imprensa do X Factor
Acompanhando Britney temos Demi Lovato que, apesar de não ser nenhuma A-lister como Miley ou até mesmo Selena, tem bastante name recognition e status entre o público juvenil para atrair uma quantidade razoável de interesse. E, assim como Spears, Demi também teve seu breakdown público: enquanto em turnê com os Jonas Brothers para promover um novo filme da Disney, a cantora agrediu uma dançarina e, aos 17 anos, foi para rehab por stress, anorexia, bulimia e vício em drogas.

Paralelo ao grande momento do X Factor, que terá sua grande estréia em setembro, Idol passava por mais uma grande crise: as suas duas grandes estrelas, Jennifer Lopez e Steven Tyler, anunciaram que não voltariam para mais uma temporada. E, assim, o programa voltava a estaca zero.

Até que, no começo da semana passada, foi revelada a carta na manga dos produtores do programa. No eterno jogo de "supere a diva da concorrência", Mariah Carey, uma das vocalistas mais famosas do mundo, foi anunciada como a nova jurada. Aguilera recebeu 10 milhões, J.Lo recebeu 12 e Britney, 15. Carey fechou por 18 milhões de dólares.

Carey é um exemplo perfeito do jurado dos sonhos: name recognition altíssimo; prestígio enorme; personalidade imprevisivel e legendária (para o bem e para o mal) e carreira cheia de altos e baixos.

Assim como todas as outras divas nos programas rivais, Mariah também teve seu fair share de sucessos e fracassos. Em setembro de 2001, depois de uma década de hit atrás de hit, Carey estava pronta para lançar seu projeto mais ousado: um combo de um novo CD com um filme, a grande estréia cinematográfica da maior diva da música estado-unidense. Glitter acabou sendo um enorme fracasso de crítica e público e foi ofuscado por outro evento que aconteceu naquele mês, o 11/09. Tudo isso fez com que a cantora entrasse num public meltdown que incluiu uma aparição bizarra num programa da MTV onde ela apareceu, sem aviso prévio, intoxicada, vestindo uma camisola, oferecendo picolés para a platéia e ameaçando uma striptease (que não aconteceu pois ela foi arrastada do palco). Depois do episódio, ela teve a obrigatória internação na rehab e alguns anos de fracasso até renascer das cinzas com o CD The Emancipation of Mimi, o grande success story da indústria fonográfica americana em 2005. Desde então, ela teve dificuldade de recriar o sucesso e lançou mais três CDs que foram relativamente ignorados, teve filhos gêmeos, casou com um homem mais jovem e ganhou (e depois perdeu) uma quantidade absurda de peso. Ou seja, uma típica trajetória de uma diva do século 21, não é mesmo? Vulnerabilidade, alto name recognition, temperamento legendário e personalidade imprevisível. Uma receita que, tudo indica, sempre atraí altos números.

A New York Magazine dessa semana fez uma comparação interessante entre Mariah, Christina e Britney com as divas reinantes do Hot 100 da atualidade. Diferente das divas de 2012, as três moças, que reinaram durante os anos 90 e o começo dos 2000, não são mestres na arte da "transparência calculada" e é fácil ver isso via o Twitter delas.

Foto que Carey mandou para a imprensa junto com o anúncio que seria jurada em Idol: muita especulação acerca da sua (pouco natural) cintura fina

Lady Gaga anuncia que acordou com uma ressaca brava e está se recuperando "comendo chicken & waffles na cama". Depois, ela faz uma brincadeirinha com Carly Rae-Jepsen, que acaba de quebrar um recorde que ela detinha no Hot 100 da Billboard: "não fique confortavel, I'm coming for you!". Já o feed de Katy Perry é cheio de algodões doces, gatinhos e docinhos enquanto a vida pessoal dela, incluindo o divórcio, é o principal atrativo do seu novo filme 3D, Katy Perry Part of Me Live, que também é bem rosa, cheio de gatinhos, doces e algodões doces.

Já Rihanna é a mais selvagem. Ela é um livro aberto e ela alterna entre postar letras de música, vídeos dela chapada e informações sobre o seu horóscopo. Ela chora publicamente a morte de sua vó e deixa claro que não está interessado na opinião daqueles que pedem para que ela se afaste do seu problemático ex (e possível atual), Chris Brown. Em seu Instagram, temos fotos dela fazendo topless enquanto de férias com as amigas e fumando cigarrinhos suspeitos. A idéia aqui é que ela está tão exposta nas redes sociais que ela é basicamente a prova de escândalos. É tanta humanidade e vulnerabilidade que fica meio boring depois de um tempo.

Enquanto isso, o Twitter de Spears, Aguilera e Carey são muito mais distantes. Os feeds delas são impessoais e usados quase exclusivamente para promover seus diversos veículos -- perfumes, CDs, etc. De fato, parece que não são sequer elas que atualizam a página e sim alguém de suas equipes. Essas mulheres são protegidas por muros altíssimos e esses muros só caem quando é por algum fracasso, algum constrangimento público ou alguma gafe. Não existe "transparência calculada", existe o "profissional" e o muito confuso e caótico pessoal.

Como a NY Mag conclui, "mesmo com um salário total de 43 milhões de dólares, contrata-las é uma decisão de negócios bastante perspicaz. A promessa de conhecer essas performers legendárias através de suas aparições semanais é apenas um tease. É a chance de assistir um hot mess que vai realmente levar os ratings a altura".

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